A Hora da Estrela: Reflexões sobre a alienação e a escrita em Clarice Lispector

A Hora da Estrela: Reflexões sobre a alienação e a escrita em Clarice Lispector

Data de Publicação: 2 de novembro de 2024 11:06:00 Em "A Hora da Estrela", Clarice Lispector nos convida a mergulhar na vida de Macabéa, uma jovem nordestina que vive à margem da sociedade carioca. Publicado em 1977, o romance revela a luta do narrador, Rodrigo S.M., em contar a história de uma protagonista invisível e alienada, desafiando o leitor a refletir sobre a condição humana e a importância de dar voz a vidas que, muitas vezes, permanecem sem eco. Neste artigo, Abílio Wolney Neto explora a profundidade ...

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 Em "A Hora da Estrela", Clarice Lispector nos convida a mergulhar na vida de Macabéa, uma jovem nordestina que vive à margem da sociedade carioca. Publicado em 1977, o romance revela a luta do narrador, Rodrigo S.M., em contar a história de uma protagonista invisível e alienada, desafiando o leitor a refletir sobre a condição humana e a importância de dar voz a vidas que, muitas vezes, permanecem sem eco. Neste artigo, Abílio Wolney Neto explora a profundidade da obra de Lispector, analisando como sua escrita metalinguística e introspectiva ilumina temas de alienação, identidade e a fragilidade da existência. (Antônio Oliveira)

 

Por Abílio Wolney Aires Neto

No livro A Hora da Estrela, Clarice Lispector explora a interioridade humana e as dificuldades de narrar a vida de alguém marginalizado. Publicado em 1977, pouco antes de sua morte, o livro narra a história de Macabéa, uma jovem nordestina que vive no Rio de Janeiro, personificando inocência e alienação. Clarice utiliza uma narrativa metalinguística, com o narrador Rodrigo S.M., que reflete sobre o processo de contar a história, tornando a obra tanto sobre a personagem quanto sobre o ato de escrever.

A trama se passa em um contexto brasileiro onde a migração para grandes cidades em busca de melhores condições de vida era comum. No entanto, Macabéa, que representa a face invisível e oprimida da sociedade, vive de forma simples e marginalizada. Ela trabalha como datilógrafa, é mal remunerada e não percebe sua própria miséria. Em várias passagens, Rodrigo descreve-a com compaixão e distanciamento, e admite: “Sei que alguns procuram a dor nas palavras como se isso fosse um alívio para a angústia.” Esse comentário reflete sua postura de desconforto e dúvida sobre a ética de narrar a vida de alguém como Macabéa.

Macabéa é invisível à sociedade, e sua vida é marcada pela ausência de amor, cuidado, autoestima e sonhos. Rodrigo observa: “Ela não sabia que era infeliz, por isso era feliz.” Essa frase reforça a desconexão de Macabéa com sua própria condição. Desde o início, sua história carrega um sentimento de finitude, e Rodrigo parece consciente de sua morte iminente, questionando-se sobre o papel da escrita em dar voz a uma vida “sem importância” para o mundo. Clarice explora a existência efêmera e a ideia de que vidas como a de Macabéa terminam sem deixar marcas.

Rodrigo não é apenas narrador; ele também se coloca como intermediário entre a autora e o leitor, enfrentando o desconforto de contar a história de uma vida modesta. Em um momento, ele diz: “Estou escrevendo por falta de assunto, porque a moça não é de se lhe tirar um romance.” Esse trecho expressa a inadequação que sente ao narrar uma vida aparentemente insignificante. A metalinguagem em A Hora da Estrela explora as dificuldades de escrever sobre temas sombrios e desconfortáveis.

Macabéa vive em um estado de alienação, sem plena consciência de sua individualidade, sendo frequentemente descrita como uma sombra ou um ser “ausente”. Ela tenta, sem sucesso, moldar-se aos padrões urbanos. Clarice Lispector utiliza um estilo fragmentado e introspectivo, característico de sua escrita, tornando a obra uma reflexão profunda. O narrador Rodrigo S.M., com suas digressões e reflexões, cria uma camada de complexidade que desafia o leitor a pensar sobre a narrativa e o papel da escrita. A obra explora o fluxo de consciência e descrições minimalistas para transmitir a pobreza de espírito e a simplicidade de Macabéa.

Ao final, A Hora da Estrela fala sobre o Brasil, a alienação e a existência. Macabéa representa os que vivem nas sombras, na periferia, sem voz e sem identidade. A narrativa de Rodrigo S.M. confronta o leitor com a precariedade da vida e a fragilidade da condição humana, levando a uma reflexão sobre a existência e o sentido de narrar histórias como a de Macabéa. A morte da protagonista surge como uma possível libertação de sua vida de miséria e alienação.

Este livro é uma meditação sobre a escrita, o autor e o personagem, e a relação entre todos esses elementos. É um exemplo da prosa de Clarice Lispector, que utiliza uma personagem aparentemente simples para tratar de questões complexas e universais da condição humana.

A frase “Quem foi temperar o choro acabou salgando o pranto” dialoga com reflexões sobre sofrimento. Embora não seja de Albert Camus, o filósofo existencialista também abordou a inevitabilidade do sofrimento e a busca humana por sentido em um mundo indiferente, onde perguntas como “Por que é que a gente sofre tanto?” ecoariam em silêncio. Para Camus, essa ausência de respostas divinas pode ser desoladora, mas também abre espaço para a “revolta”: a aceitação da falta de sentido enquanto se vive plenamente, criando significado nas próprias ações.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
*É natural de Dianópolis (TO),
Juiz de Direito em Goiânia,
autor de 15 livros e membro  
da Academia Goiana de Letras.

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