CRÔNICA – Castelo de medos

CRÔNICA – Castelo de medos

Data de Publicação: 7 de outubro de 2024 15:21:00 Nesta crônica, o autor nos transporta para um domingo tranquilo em Palmas, onde a simplicidade de um passeio pela Praia da Graciosa se transforma em um encontro inesperado com a curiosidade e a pureza de uma criança.

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 Nesta crônica, o autor nos transporta para um domingo tranquilo em Palmas, onde a simplicidade de um passeio pela Praia da Graciosa se transforma em um encontro inesperado com a curiosidade e a pureza de uma criança. Entre diálogos leves e bem-humorados, a narrativa contrasta a vastidão das águas do Tocantins com a inocência infantil, trazendo uma reflexão suave, mas profunda, sobre os perigos reais e imaginários que nos cercam. Um texto que convida o leitor a apreciar a beleza das pequenas interações cotidianas, enquanto sugere uma ponderação sutil sobre a vulnerabilidade humana.

 

 

Praia da Graciosa, Palmas (Foto: Antônio Oliveira)

Por Antônio Oliveira

Este domingo, 6 de outubro de 2024, foi um dia agradável, com clima ameno, resultado da chuva calma que caiu sobre Palmas durante a noite passada. Estava perfeito para pedalar pela cidade e caminhar pela praia. E foi o que fiz: pedalei até a Praia da Graciosa, uma das mais belas praias do Lago de Palmas, aqui na capital do Tocantins.

Cheguei, sentei-me sobre um velho tronco tombado na areia da praia e comecei a apreciar grandes espetáculos da natureza e da arquitetura dos homens: a vastidão das águas do Tocantins, que alimentam uma potente hidrelétrica 60 quilômetros abaixo; as ondas que, no seu vai e vem, beijam a areia; e os arranha-céus estrategicamente erguidos na orla.

Minha contemplação foi interrompida por um garoto de uns 3 anos. Ele se aproximou, sentou-se ao meu lado e, com sua santa inocência, começou a me questionar.

– Você tem medo de cobra? – perguntou, iniciando uma série de perguntas.

– Tenho medo até de minhoca.

– Mas minhoca não faz mal.

– Se eu tenho medo de minhoca, imagina o tamanho do meu medo de cobra.

Ele pegou uma conchinha na areia, mostrou-me e continuou a perguntar.

– Você tem medo de arraia? Olha esta aqui, pequenininha.

– Isso não é uma arraia, é uma conchinha.

– Mas você tem medo de arraia?

– Deus me livre, nem pensar. O ferrão de uma arraia  dá uma dor insuportável – respondi.

– E de dragão, você tem medo?

– Aqui eu não tenho medo, pois se ele lançar labaredas de fogo, eu caio na água.

– É, a água apaga o fogo do dragão – ele concordou.

Ficamos em silêncio por alguns segundos, até ele perguntar novamente:

– Você me ajuda a construir um castelo?

– O que vai ter no seu castelo?

– Minhoca, cobra, arraia e dragão – respondeu.

– Deus me livre, não conte comigo nessa construção.

E ele continuou a erguer seu castelo da doce infância.

Já estava escurecendo, então decidi pedalar de volta para casa.

– Rapazinho, eu vou embora. Volte para seus pais – disse-lhe, acreditando que seus pais estavam em algum dos grupos sentados na areia. Que nada! Ele saiu correndo em direção a um dos piers, bem distante de onde estávamos. Acompanhei-o de longe, para ver se encontrava seus pais. Sim, estavam lá, aparentemente alheios à presença do filho.

Fui embora enternecido pela conversa com aquele pequeno, mas refletindo que, mais perigoso do que minhoca, cobra, arraia e dragão, seria estar por ali um lobo mau disfarçado de ovelha, fazendo suas maldades.

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